Palabra Clave (La Plata), octubre 2023 - marzo 2024, vol. 13, núm. 1, e205. ISSN 1853-9912
Universidad Nacional de La Plata
Facultad de Humanidades y Ciencias de la Educación
Departamento de Bibliotecología

Artículos de temática libre

Divulgação científica em bibliotecas universitárias: reflexões e possíveis caminhos

Maria Giovanna Guedes Farias

Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação, Universidade Federal do Ceará, Brasil
Francisca Clotilde de Andrade Maia

Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação, Universidade Federal do Ceará, Brasil
Nicolle Negreiros de Lima Santos

Universidade Federal do Ceará, Brasil
Cita sugerida: Farias, M. G. G., Maia, F. C. A. y Santos, N. N. L. (2023). Divulgação científica em bibliotecas universitárias: reflexões e possíveis caminhos. Palabra Clave (La Plata), 13(1), e205. https://doi.org/10.24215/18539912e205

Resumo: Este artigo tem como objetivo refletir sobre como as bibliotecas universitárias (BUs) podem atuar na divulgação científica, propondo ações que visem promover a aproximação da comunidade (usuários, potenciais e não usuários, sociedade em geral) com a ciência. A abordagem metodológica utilizada teve como base a revisão de literatura narrativa, se caracterizando como um estudo exploratório, por propor caminhos para que a divulgação do conhecimento científico seja efetivada nas bibliotecas universitárias. Os resultados demonstram que se faz necessário expandir as iniciativas, utilizando, por exemplo, as redes sociais institucionais como ferramentas para fomentar a interação e o engajamento da sociedade, despertando a curiosidade e o interesse pela ciência. Além disso, as autoridades universitárias devem elaborar políticas de fomento à capacitação contínua dos bibliotecários para que possam atuar como divulgadores da ciência, que tenham por base os três paradigmas da divulgação científica, quais sejam: ações formativas e reflexivas para corpo funcional; disseminação; e participação pública. Conclui-se que a BUs demonstram ter um expressivo potencial de atuação junto ao seu entorno e à sociedade que lhe cerca, podendo atuar para que essa sociedade se sinta cada vez mais pertencente aos espaços de ciência e tecnologia e de seus resultados.

Palavras-chave: Pesquisa científica, Divulgação científica, Bibliotecas universitárias, Relações universidade - sociedade, Brasil.

Scientific dissemination in university libraries: reflections and possible paths

Abstract: This article aims to reflect on how university libraries can act in scientific dissemination, proposing actions aimed at promoting the approximation of the community (users, potential and non-users, society in general) with science. The methodological approach used was based on the narrative literature review, being characterized as an exploratory study, by proposing ways for the dissemination of scientific knowledge to be effective in university libraries. The results show that it is necessary to expand initiatives, using, for example, institutional social networks as tools to foster interaction and engagement of society, awakening curiosity and interest in science. In addition, university authorities should develop policies to promote the continuous training of librarians so that they can act as science communicators, based on the three paradigms of scientific dissemination, namely: formative and reflective actions for staff; dissemination; and public participation. It can be concluded that the university library has an expressive potential to act together with its surroundings and the society around it, being able to act so that this society feels increasingly belonging to the spaces of science and technology and its results.

Keywords: Scientific research, Scientific dissemination, University libraries, University - society relationships, Brasil.

La divulgación científica en las bibliotecas universitarias: reflexiones y caminos posibles

Resumen: Este artículo reflexiona sobre cómo pueden actuar las bibliotecas universitarias en la divulgación científica, proponiendo acciones encaminadas a promover el acercamiento de la comunidad (usuarios, potenciales usuarios y no usuarios, sociedad en general) con la ciencia. El enfoque metodológico utilizado se basó en la revisión de la literatura, caracterizándose como un estudio exploratorio, para proponer formas para que la difusión del conocimiento científico sea efectiva en las bibliotecas universitarias. Los resultados muestran que es necesario ampliar las iniciativas, utilizando, por ejemplo, las redes sociales institucionales como herramientas para fomentar la interacción y el compromiso de la sociedad, despertando la curiosidad y el interés por la ciencia. Además, las autoridades universitarias deben desarrollar políticas que promuevan la formación contínua de los bibliotecarios para que puedan actuar como divulgadores de la ciencia, basándose en los tres paradigmas de la divulgación científica, a saber: acciones formativas y reflexivas para el personal; diseminación; y participación pública. Se concluye que las bibliotecas universitarias poseen un potencial expresivo de actuar junto con su entorno y la sociedad que la rodea, pudiendo actuar para que esta se sienta cada vez más involucrada en los espacios de ciencia y tecnología y sus resultados.

Palabras clave: Investigación científica, Divulgación científica, Bibliotecas universitarias, Relaciones universidad - sociedad, Brasil.

1. Introdução

As bibliotecas universitárias (BUs) fazem parte das instituições que mais desenvolvem estudos, pesquisas, investigações no Brasil, e, por isso, podem desempenhar um relevante papel na divulgação dos conhecimentos científicos produzidos nas universidades. Destarte, a iniciativa de discorrer sobre essa temática ocorre pela compreensão de que as BUs tem um lugar de destaque na sociedade, com atuação profícua na disseminação do conhecimento científico produzido por pesquisadores, como discentes e docentes de cursos de graduação, pós-graduação e iniciação científica, se caracterizando dessa forma como uma potencial e real divulgadora da ciência, contribuindo assim, para o desenvolvimento em diversos aspectos da sociedade: cultural, social, econômico, político e tecnológico.

Para poder atuar com a divulgação científica (DC), as BUs necessitam incentivar o desenvolvimento em seus colaboradores de competências com foco em compartilhar e/ou disseminar informações científicas e tecnológicas, em linguagem compreensível, para o público em geral, permitindo seu amplo acesso, principalmente por meio da veiculação de informações científicas nos mais diversos meios de comunicação, com a finalidade de proporcionar a democratização do acesso ao conhecimento científico e tecnológico. Destarte, se faz premente que as BUs incentivem a aproximação e participação da população em relação ao conhecimento científico, em razão do seu imprescindível papel social.

As possíveis ações e/ou caminhos a serem desenvolvidos pelas BUs para atuar na divulgação do conhecimento científico, perpassam pela seguinte questão: de que forma as BUs podem colaborar com a DC para a academia e para a sociedade em geral, em especial neste momento de intensa exposição da ciência e de pesquisadores? Bucchi & Trench (2021) refletem que o atual contexto pandêmico e o impacto de uma exposição pública sem precedentes de cientistas na imagem pública e percepção da ciência, precisará de tempo para se compreender a dimensão do que está sendo experimentado neste momento, no que se refere à aproximação da ciência e dos cientistas com a sociedade.

Como observa-se, este é um contexto complexo, no qual as BUs podem desempenhar papel relevante ao atuar na comunicação por meio da divulgação para o público em geral, com foco em desmistificar as notícias falsas, munindo a sociedade de ferramentas que ajudem as pessoas a compreenderem quais são as reais e confiáveis fontes de informação, e como identificar, por exemplo, o que é produzido para gerar dúvidas e não merece credibilidade. Além de poder contribuir para mostrar quais são os possíveis impactos sociais motivados pela ciência e tecnologia, e de que maneira esses impactos contribuem para o desenvolvimento da população e, consequentemente, para o cotidiano dos indivíduos. Além disso, as BUs poderiam criar espaços de diálogo/aproximação entre pesquisadores e a sociedade em geral.

Os aspectos acima elencados motivaram este estudo, o qual se concentra em refletir sobre de que forma as BUs podem contribuir com ações, produtos e serviços, visando promover a DC, ao buscar aproximar usuários e potenciais usuários da biblioteca, bem como a sociedade em geral, da ciência.

2. Metodologia

A abordagem metodológica utilizada para a construção deste estudo teve como base a revisão de literatura narrativa, ao consultar obras nacionais e internacionais que tratam a respeito de BUs e de DC. Green, Johnson & Adams (2006) definem as revisões narrativas em três tipos: editoriais, comentários e visão geral. Os autores entendem que as revisões narrativas de visão geral se constituem como um componente importante na base da literatura, pois são sínteses narrativas amplas, que condensam e relatam informações publicadas anteriormente. Ainda de acordo com os autores essa modalidade de revisão produz “artigos educacionais úteis, pois reúnem muitas informações em um formato legível”, sendo, portanto, bastante utilizados em sala de aula, pois “fornecem uma fonte única para os alunos lerem e expõem os alunos à literatura revisada por pares” (Green, Johnson & Adams, 2006, p. 103, tradução nossa).

No caso específico desta pesquisa foi realizada uma revisão de literatura narrativa da categoria overview, ou seja, visão geral, por se tratar da análise de artigos recuperados com o intuito de “descrever e discutir o desenvolvimento ou o ‘estado da arte’ de um determinado assunto, sob ponto de vista teórico ou contextual”, como afirma Rother (2007, p. 7). Ainda segundo a autora, esse tipo de revisão não informa as “fontes de informação utilizadas, a metodologia para busca das referências, nem os critérios utilizados na avaliação e seleção dos trabalhos”. No entanto, para clarificar a busca por materiais visando fundamentar esta investigação, apresenta-se os termos de busca, as bases de dados e o período da coleta: BUs, DC, comunicação da ciência; Portal de Periódicos da Capes, Web of Science e SciELO, nos meses de maio a novembro de 2021.

Durante a busca foram utilizados os termos centrais desta pesquisa de forma individual e de forma combinada, a fim de localizar artigos que tratassem da temática deste estudo na língua portuguesa e inglesa, havendo uma variação entre as palavras ciência e científica para maior abrangência, quais sejam: BUs e divulgação científica; biblioteca universitária e divulgação da ciência; biblioteca universitária; divulgação científica; divulgação da ciência; science communication; science dissemination; university library; science communication and university library.

Após o levantamento procedeu-se com a análise do material recuperado, a fim de começar a construção textual, a qual se deu por meio de um estudo exploratório. A justificativa para a utilização deste tipo de estudo, se dá pelo fato de proporcionar aproximação e familiaridade dos pesquisadores com as temáticas em foco; e ainda pelo fato de que neste levantamento de literatura terem sido propostos ações e caminhos possíveis para a divulgação do conhecimento científico pelas BUs.

3. Divulgação científica

O conhecimento científico é produzido por meio de diferentes etapas, desde a formulação de uma problemática, observada a partir de um fenômeno, com o estabelecimento de hipóteses e de uma metodologia, que validará ou não as questões apresentadas, para assim, apresentar e comunicar seus resultados para a comunidade científica. Todas as etapas são relevantes, pois possibilitam a produção do conhecimento, no entanto, a etapa da comunicação científica influencia sobremaneira nesse processo, pois oportuniza a retroalimentação e a evolução da ciência, uma vez que os pesquisadores se baseiam em publicações científicas para produzir novos estudos e propiciar a evolução da ciência.

Para Caribé (2015) há na literatura uma diversidade de conceitos e definições que envolvem e descrevem os sujeitos e os processos da comunicação científica, podendo citar: alfabetização e educação científica, difusão científica, comunicação pública da ciência, disseminação científica, bem como popularização, divulgação e vulgarização da ciência. A população em geral é o alvo da divulgação, popularização ou vulgarização científica, considerados sinônimos por Caribé (2015). Segundo a autora, os termos divulgação e vulgarização, originados do radical latino vulgus, não são utilizados nos países anglófonos, onde há a predominância do termo popularização. Massarani (1998) afirma que esses termos são, muitas vezes, utilizados erroneamente como sinônimos. Dessa forma, opta-se por utilizar o termo DC neste estudo.

Para Nascimento (2016, p. 97) a DC “é toda atividade de produção, transmissão e explicação dos conhecimentos, da cultura e do pensamento científicos e tecnológicos, realizada em espaço formal e/ou não-formal de ensino”. Na visão da autora, a divulgação não se restringe a compartilhar de forma unilateral o conhecimento científico no espaço formal, mas inclui também a transmissão da cultura e o pensamento científico e tecnológico para além dos espaços tradicionais e formais de ensino, pesquisa e extensão. Tal perspectiva busca proporcionar um entendimento amplo dos ambientes no qual atua a DC e do tipo de conhecimento que é partilhado.

Kappel & Holmen (2019) entendem que de modo geral, há na literatura científica uma concordância acerca do estabelecimento de dois paradigmas na DC, o paradigma da disseminação e o paradigma da participação pública.

Como explicam os autores, os modelos pautados no paradigma da disseminação são centrados na transmissão, bem-sucedida, de informações sobre a ciência para o público. Para os autores, as visões mais proeminentes assumem que esses modelos de disseminação devem ser difundidos por meio da educação em ambiente escolar formal, ou por meio da reeducação propiciada a partir dos meios de comunicação de massa.

A educação em ambiente formal, segundo Kappel & Holmen (2019), tem levado países a reavaliarem o enfoque atribuído aos conteúdos científicos pelas bases curriculares, além de esforços empreendidos pelas universidades para incentivarem a formação científica continuada de seus egressos, como cursos de especialização e outras pós-graduações.

Já a disseminação por meio da comunicação de massa atua na perspectiva da produção de livros de popularização científica, documentários, revistas de ciência e, segundo os autores, mais recentemente, a utilização de blogs e sites para comunicar a ciência. Pode-se citar como exemplo de comunicação de massa a revista brasileira Superinteressante, publicada pela editora Abril, desde 1987.

A revista, que está disponível em versão impressa e digital, apresenta matérias sobre ciência, história, saúde e educação, aproximando os temas com o cotidiano, de forma lúdica e criativa. Por ter uma linguagem acessível e de fácil entendimento, se torna um material com capacidade para aproximar e instigar a curiosidade de jovens e crianças pelo conhecimento científico, no entanto, por ser uma iniciativa de origem privada, o seu acesso é exclusivo para assinantes.

Como explicam Kappel & Holmen (2019), apesar de o método linear e unidirecional de transmissão de informações ser o mais adotado, estudiosos têm considerado um modelo contextual no qual determinado indivíduo está inserido pode afetar a sua percepção e avaliação da ciência. A partir disso, Brossard & Lewenstein (2010, p. 14) entendem que:

[...] os indivíduos não respondem como recipientes vazios à informação, mas processam a informação de acordo com esquemas sociais e psicológicos que foram moldados por suas experiências anteriores, contexto cultural e circunstâncias pessoais. O modelo reconhece que os indivíduos recebem informações em contextos particulares, que então moldam como eles respondem a essas informações. Problemas psicológicos pessoais podem afetar o contexto, como estágio da vida ou tipo de personalidade (medroso, agressivo), assim como o contexto social em que a informação é recebida [...].

Dessa forma, os modelos pautados na disseminação devem reconhecer o contexto, a heterogeneidade e pluralidade do público, bem como as consequências que tal pluralidade pode ter no modo como as pessoas reagem aos esforços de disseminação.

O paradigma da participação pública atua na perspectiva de fomentar o estabelecimento da comunicação, o diálogo e até mesmo a deliberação entre a sociedade, cientistas e gestores, formuladores de políticas públicas. Conforme explicam Kappel & Holmen (2019), são diversos os modelos de atividades e eventos pautados nesse paradigma, incluindo desde audiências públicas e referendos, science shops,1 ciência cidadã, práticas em que cidadãos participam de maneira ativa nas produções de pesquisas científicas e conferências de consenso. De acordo com Pellegrini Filho (2005) estes são eventos que convocam a sociedade para discutir assuntos polêmicos e sensíveis relacionados à ciência e tecnologia, a fim de permitir o debate entre especialistas e não-especialistas, tendo como um dos objetivos da discussão a elaboração de políticas públicas e diretrizes a partir do consenso estabelecido entre os participantes.

Kappel & Holmen (2019) acreditam que uma forma de diferenciar os dois paradigmas, é enfatizar os diferentes objetivos de divulgação da ciência apontado por cada paradigma e as diferenças entre os métodos e saídas que cada modelo emprega. A fim de compreender como se constitui a divulgação da ciência na literatura contemporânea, os autores definem em seu trabalho uma estrutura conceitual em que investigam os principais objetivos da DC para a sociedade encontrados na literatura.

O objetivo melhorar as crenças da população sobre a ciência está relacionado a aumentar “o número de pessoas que mantêm crenças precisas sobre novas descobertas científicas, fatos científicos, métodos científicos, quais possibilidades e limitações a ciência está sujeita e quais são os riscos associados aos empreendimentos científicos.” (Kappel & Holmen, 2019, p. 3). Para os autores, tal objetivo, que está diretamente vinculado a outros (sub)objetivos, como diminuir o número de crenças científicas equivocadas, surgiu a partir de pesquisas nacionais, que revelaram o desconhecimento de parte da população sobre conhecimentos científicos básicos. Mencionam que os indicadores apresentados pela National Science Foundation de 1988 revelaram que somente 46% dos americanos sabiam que a Terra gira ao redor do sol durante o período de um ano.

O objetivo gerar aceitação social trata de tentar alcançar e fomentar atitudes pró-ciência, seja em relação ao financiamento, à governança e a aplicação da ciência. Os autores defendem que a comunidade científica acredita que a falta de compreensão do conhecimento científico é uma das razões para o baixo índice de apoio público, político e social à ciência, bem como para explicar por quais razões há resistência da sociedade em acreditar no conhecimento divulgado, mesmo em temas em que há o consenso de especialistas e evidências científicas consolidadas, como por exemplo, nas pesquisas a respeito das ações humanas e suas relações com as mudanças climáticas e da importância de campanhas de vacinação para o controle de doenças.

Para compreender o objetivo gerar confiança epistêmica e moral pública é preciso levar em consideração que a confiança epistêmica se trata do contexto em que o indivíduo acredita no que determinada instituição comunica como verdadeiro e epistemologicamente justificado, exceto nos casos nos quais existem razões explícitas capazes de demonstrar a invalidade das evidências expostas. O intuito da confiança epistêmica é imbuir nos cidadãos a capacidade de compreender e corresponder aos esforços comunicativos das instituições em relação às suas produções científicas, descobertas e atuação. Já a confiança moral reside na crença da população de que a instituição se comporta e age conforme os preceitos moralmente aceitáveis, mesmo quando não há informações que comprovem tal comportamento (Kappel & Holmen, 2019).

O objetivo coletar a opinião dos cidadãos sobre objetivos de pesquisa aceitáveis/valiosos e as aplicações da ciência trata de buscar ampliar a percepção e compreender as preocupações da população a respeito de determinados tópicos da ciência e os seus impactos no contexto da sociedade (Kappel & Holmen, 2019).

O objetivo gerar apoio político para a ciência é compreendido como a tentativa de promover atitudes favoráveis e pró-ciência entre formuladores de políticas públicas, organizações e demais instituições que impactam no financiamento e na governança da ciência.

O objetivo coletar e fazer uso do conhecimento local trata de práticas que consideram o conhecimento local e suas contribuições para as investigações científicas (Kappel & Holmen, 2019). Tal objetivo se baseia no reconhecimento da importância do conhecimento local de determinadas comunidades, comumente formado a partir da empiria e da observação de fenômenos naturais e sociais.

O objetivo fazer uso do conhecimento distribuído ou recursos cognitivos encontrados na cidadania, denominada como ciência cidadã, se trata do processo de incorporar e possibilitar a participação dos cidadãos nas etapas da investigação científica. Os autores citam como exemplos os casos em que a população seja capaz de informar a respeito da vida selvagem de determinada região a qual vivem, contribuindo para pesquisas acerca de ecologia e ecossistemas.

O objetivo reforçar a legitimidade democrática do financiamento, governança e aplicação da ciência ou segmentos específicos da ciência diz respeito às garantias de que as tomadas de decisões normativas a respeito da ciência e de seu financiamento são baseadas na legitimidade democrática, com a devida transparência dos processos e com a participação do público-leigo.

É possível perceber a existência de relações interdependentes e intrínsecas entre os objetivos apresentados. Além de ilustrá-los, os autores buscam evidências empíricas e iniciativas para avaliar se os objetivos têm sido cumpridos e seus propósitos alcançados. Embora haja a presença desses objetivos na literatura, implícita ou explicitamente, os autores dissertam em suas análises que não há o aprofundamento teórico necessário, e o aprofundamento das relações e interações entre eles são pouco explorados, de modo a não garantir o sucesso dos esforços comunicativos da ciência. Não é o propósito deste trabalho contribuir com a discussão dos objetivos elencados acima, no entanto, é elementar ressaltar a preocupação de Kappel & Holmen (2019), ao definirem que se faz necessário estabelecer as bases teóricas e filosóficas dos objetivos e modelos de divulgação da ciência, a fim de que as práticas e iniciativas possam atuar de modo concreto e alcançar os resultados esperados.

Bueno (2010) imputa à DC a capacidade de permitir que as pessoas tenham a compreensão, mesmo que mínima, do contexto e espaço onde vivem, sejam capazes de absorver e de se apropriar dos avanços científicos e tecnológicos proporcionados pelo progresso da ciência e, segundo Brownell, Price & Steinman (2013), de compreender os fundamentos básicos da ciência para tomar decisões informadas e conscientes.

Isso acontece, por que, de acordo com Brownell, Price & Steinman (2013), embora os cientistas sejam especializados em metodologias de pesquisa, análise de dados e comunicação com outros cientistas, a capacitação para o diálogo com o público leigo é incipiente ou inexistente. Para isso, se faz necessário o uso de vocabulários e técnicas que facilitem o entendimento, melhorem a comunicação, pois é possível que os conceitos e termos básicos necessários para a explicação e o entendimento da teoria podem ser completamente desconhecidos pela população, ou ter outra conotação, como o exemplificado por pesquisadores da neurociência:

[...] um problema para os especialistas comunicarem neurociência a não cientistas pode ser a falta de conhecimento de maneiras eficazes de se comunicar com não cientistas. Os neurocientistas podem supor que palavras como “neurônio” ou “sinapse” são de conhecimento comum, quando na verdade a maioria da população pode não ter uma definição funcional desses termos. [...] palavras como “proteína” têm significados diferentes na linguagem cotidiana (por exemplo, shakes de “proteína”) do que em um contexto biológico. As lacunas entre o que os cientistas supõem que o público em geral sabe e o que o público em geral realmente sabe podem ser superadas pelo refinamento dessas habilidades de comunicação no treinamento de cientistas (Brownell, Price & Steinman, 2013, p. 7).

Esses autores reforçam que a dificuldade de comunicar a ciência pode estar diretamente relacionada à falta de conhecimento sobre estratégias eficazes para fazê-la, e sobre o desconhecimento da população leiga de conceitos básicos dos campos científicos. Dessa forma, para o desenvolvimento de habilidades de comunicação condizentes com o nível de entendimento do público em geral demanda prática e especial atenção à linguagem empregada.

Para contornar tal situação, Hinko, Seneca & Finkelstein (2015) identificaram quatro estratégias utilizadas por educadores que atuam na área de física e realizam a DC de suas pesquisas para crianças, quais sejam: analogia, ilustração, explicação e coloquialismo, que objetivam evitar o uso inadequado de jargões científicos e alcançar maior efetividade na divulgação da ciência.

Segundo os autores, na analogia o divulgador traça paralelos com termos ou situações que sejam potencialmente mais familiares ao público para explicar o conceito científico. Na ilustração, são utilizados exemplos para ilustrar ou tangibilizar o conceito. A explicação tenta descrever o termo utilizado pelo divulgador e o coloquialismo simplifica o entendimento do conceito utilizando palavras do cotidiano. Exemplos das quatro estratégias estão apresentadas no Quadro 1.

Quadro 1.
Estratégias de comunicação de conceitos científicos e exemplos.
Exemplo
Analogia“Estamos entendendo como as moléculas interagem umas com as outras, explodindo-as com um laser e descobrindo como elas eram originalmente. [...] como se estivéssemos jogando boliche e tentando colocar os pinos de volta com base em onde eles caíram em primeiro lugar.”
Ilustração“Por minúsculo quero dizer muito menor do que nem mesmo um fio de cabelo humano, mas menos de um milésimo de um fio de cabelo humano, ou até menor.”
Explicação“[...] um vácuo é essencialmente um lugar que não tem ar” “Pego moléculas, que são apenas pequenos (...) grupos de átomos juntos”
Coloquialismo“[...] essa é realmente apenas uma grande palavra para dizer que atiramos lasers nas coisas e vemos o que acontece.” “[...] esses átomos vão se mexer dentro desse material.”
Fonte: Hinko, Seneca & Finkelstein (2015).

Apesar dos exemplos serem específicos da área Física, as definições das estratégias podem ser avaliadas e aplicadas aos diferentes contextos e áreas do conhecimento científico. Para o êxito das estratégias de comunicação da ciência e da DC, se faz necessário que utilizem um vocabulário simples e que seja facilmente compreendido por uma ampla parcela do público-alvo. Além disso, Rennó, Guzzo, Machado & Sato (2020) reiteram a importância de combinar a utilização de mais de uma estratégia, para garantir o entendimento dos conceitos a partir da realidade do público, a efetividade da comunicação e a transposição das ideias.

Bucchi (2013) alerta que novos cenários comunicativos multiplicam a variedade de produtores de DC, os quais trazem seus próprios objetivos e estratégias, mas a transparência e a vontade de problematizar a própria definição do ato de comunicar a ciência é o caminho para evitar o aumento da desconfiança do público. Por isso, ressalta a necessidade de termos um público mais ativo e competente, o que irá exigir que as “instituições públicas forneçam infraestruturas educacionais mais fortes, em vez de investir em esforços de comunicação míopes e de curto prazo” (Bucchi, 2013, p. 911).

Desse modo, é possível perceber a relação de complementaridade entre os diferentes objetivos e o desabrochar de um campo fértil para a DC, que para atingir uma parcela significativa de seu público, deve estar presente nas diversas instâncias do processo educacional, desde os primeiros anos da educação básica, composta pelos níveis de ensino infantil, fundamental e médio, e a conclusão do ensino superior, tendo em vista ser o ambiente escolar capaz de instigar, desde os anos iniciais, a alfabetização e a educação científica, bem como o pensamento crítico-reflexivo. A sociedade tem a capacidade de refletir e de se apropriar da informação científica e tecnológica, podendo utilizá-la em seu dia a dia e fazendo parte do seu processo de produção, possibilidade oportunizada a partir da ciência cidadã, um movimento oriundo da ciência aberta que visa a participação da população nas diferentes etapas de produção do conhecimento científico

Albagli (1996) ressalta a importância de analisar a forma como a sociedade compreende a ciência, se apropria de seus resultados e quais canais de comunicação científica e tecnológica utiliza. Com esse intuito, o Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações junto ao Centro de Gestão de Estudos Estratégicos realizam a pesquisa denominada "Percepção Pública da Ciência e Tecnologia no Brasil".2 A quinta rodada da pesquisa aconteceu em 2019 e entrevistou 2.200 pessoas, de todas as regiões do país e com faixa etária entre 16 e 75 anos de idade (Centro de Gestão e Estudos Estratégicos, 2019).

Tal pesquisa se consolida como uma importante ferramenta estratégica para a criação de projetos e formulação de políticas públicas, uma vez que direciona à pontos nevrálgicos a respeito da percepção pública da ciência e proporcionam, por meio de órgãos governamentais e instituições de pesquisa, tomadas de decisões que tenham atuações mais objetivas e fundamentadas.

As próximas edições da pesquisa serão essenciais para estabelecer uma análise comparativa entre os dados que demonstram a confiança da população na ciência e nos cientistas em um cenário anterior à pandemia de Covid-19, com os dados que apontem essa relação ao cenário seguido à pandemia, tendo em vista a mobilização das mais diversas áreas do conhecimento científico, que atuaram conjuntamente no desenvolvimento de vacinas, no combate à desinformação e no convencimento acerca da importância de aderir às medidas protetivas.

Segundo os dados da pesquisa de 2019, um percentual de 88% dos entrevistados não foi capaz de citar o nome de alguma instituição que faça pesquisa no país, além disso, as universidades foram pouco citadas, mesmo sendo notadamente reconhecidas como as principais responsáveis por cerca de 95% da produção científica no país, conforme Moura (2019).

Outro ponto questionado foi a respeito de visitas a espaços de divulgação do conhecimento científico e tecnológico. A figura 1 apresenta uma análise comparativa dos percentuais de visitação desses ambientes entre os anos de 2006 a 2019.

Figura 1
Visita a espaços de acesso à Ciência e Tecnologia.
Visita a espaços  de acesso à Ciência e Tecnologia.
Fonte: Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (2019).

De acordo com o exposto na figura acima, todos os espaços considerados difusores da Ciência e Tecnologia, tais como bibliotecas, museus, exposições, jardins botânicos, olimpíadas e outros, recebiam um número crescente de visitantes entre os anos de 2006 e 2015, no entanto, de 2015 a 2019 houve uma queda significativa no índice de visitação. A respeito das justificativas apresentadas para não visitar esses ambientes, apenas as dos museus de ciência e tecnologia são mencionadas na pesquisa, de modo que 34,5% afirmam não existir um na região em que vive, 20% não teve tempo e 19% não está interessado.

As justificativas apresentadas para não visitar museus de ciência e tecnologia, as únicas mencionadas na pesquisa, indicam que 34,5% dos respondentes afirmam não existir um na região em que vive, 20% não teve tempo e 19% não está interessado.

Em outra perspectiva, e especificamente a respeito das bibliotecas, 82% dos entrevistados afirmaram não ter visitado bibliotecas nos últimos dozes meses (Centro de Gestão e Estudos Estratégicos, 2019). Como mencionado anteriormente, a pesquisa não aponta de forma descritiva os motivos pelos quais a população deixa de frequentar os espaços de acesso à ciência e tecnologia, em especial as bibliotecas, que são notoriamente reconhecidas pela sua função social, pelo ambiente propício para leitura e pesquisa em fontes de informação confiáveis.

Destarte, é pertinente que a gestão desses espaços desenvolva estratégias para estimular a população a conhecer, se apropriar e visitar com mais frequência tais ambientes. E também, atuar diretamente no fomento à capacitação de seus cientistas e pesquisadores como divulgadores científicos, tendo em vista que 82% dos entrevistados (Centro de Gestão e Estudos Estratégicos, 2019) acreditam que a maioria das pessoas é capaz de compreender o conhecimento científico se bem explicado.

É premente que instituições de pesquisa e espaços considerados difusores da ciência, como museus, planetários, feiras científicas e bibliotecas, com suas diferentes tipologias, seja a pública, a escolar, a comunitária e principalmente a universitária, tenham ações voltadas para a divulgação do conhecimento científico produzido em suas instâncias, bem como estratégias para atrair a população para visitar e se apropriar desses ambientes.

4. Bibliotecas universitárias

As BUs são responsáveis pelo armazenamento, preservação, recuperação e disseminação do conhecimento científico e tecnológico gerado pelas universidades, representando ambientes multifuncionais que desenvolvem produtos e serviços com o intuito de proporcionar acesso à informação para os seus usuários reais e potenciais. De acordo com Cunha & Cavalcanti (2008), a BU satisfaz as necessidades informacionais dos docentes e discentes e do corpo técnico-administrativo, oferecendo apoio ao ensino, à pesquisa e à extensão.

Conforme Nascimento (2016, p. 70), a função da BU consiste na promoção do acesso ao conhecimento e “infraestrutura informacional e documentária que serve de apoio às atividades da comunidade universitária, permitindo aos alunos, professores e pesquisadores que realizem seus estudos [...]”. Os usuários das BUs são comumente a comunidade acadêmica, contudo, percebe-se que a sociedade em geral é considerada como um potencial usuário, conforme menciona o autor. As universidades, seus estudos e pesquisas são financiados com recursos públicos, portanto, é imprescindível que as descobertas e os conhecimentos científicos produzidos retornem de alguma maneira para a população, resultando em contribuições para a sua vida cotidiana.

De acordo com Vrana (2019), as escolas, as universidades e as bibliotecas são ambientes de aprendizagem que permitem a compreensão sobre os significados dos conceitos científicos. Ademais, conforme Ferreira (2012), as BUs são espaços de cidadania desenvolvidos para a comunidade em geral, a qual, por vezes, tem acesso precário à informação. Nesta perspectiva, as BUs se tornam fundamentais por poderem permitir à sociedade o acesso, confiável e mediado, a informações e conhecimento científico, gerado pela comunidade acadêmica.

Contudo, Nascimento (2016, p. 43) enfatiza que a população em geral “não têm o hábito de visitar espaços científicos e culturais”. À vista disso, as BUs necessitam estimular o contato e o diálogo com a sociedade e, considerando que reúnem a produção universitária, são capazes de desempenhar um papel relevante na divulgação do conhecimento científico e tecnológico visando, principalmente, a democratização do acesso à informação. De acordo com Nascimento (2016, p. 43), “a biblioteca universitária se insere como um espaço – físico ou virtual – potencialmente fértil para a prática da socialização dos conhecimentos científicos e tecnológicos”. Todavia, apesar das suas diversas potencialidades, como as BUs podem desenvolver ações de divulgação científica do conhecimento produzido pelas universidades? De que maneira podem incentivar a aproximação entre ciência e população e, inclusive, a participação popular? Esses questionamentos suscitaram a produção deste artigo e começam a ser respondidos, ainda de forma preliminar, na próxima seção.

Em pesquisa realizada nas bibliotecas universitárias públicas paulistas (BUPPs), Nascimento (2016) objetivou captar o potencial que as BUs detêm como espaços / canais de DC e de socialização do conhecimento científico e tecnológico. A pesquisa revela que, para as BUPPs constituírem espaços de DC, existem potencialidades para serem exploradas. Contudo, a reduzida incidência de iniciativas de DC nas BUPPs “decorrem de dois motivos que se complementam e se retroalimentam”, que consiste, primeiramente, na:

[...] falta de familiaridade, entre os bibliotecários, com os conceitos de “comunicação”, “difusão”, “disseminação”, divulgação”. [...] O segundo motivo para poucas atividades de DC nas BUPPs é a ausência de metas explícitas nos planejamentos estratégicos dos sistemas de bibliotecas pesquisados, que direcionem as bibliotecas para planejarem e desenvolverem ações, produtos e serviços de DC (Nascimento, 2016, pp. 100-101).

Portanto, os bibliotecários necessitam adquirir novos conhecimentos e, inclusive, aperfeiçoar suas competências para colaborarem no desenvolvimento e execução das iniciativas de DC que permitam alcançar a sociedade, possibilitando o diálogo e a interação com a população em geral, com o intuito de fomentar a compreensão dos indivíduos acerca do papel social da ciência. Destarte, é preciso que as ações e/ou iniciativas de divulgação sejam consideradas essenciais e, consequentemente, as BUs necessitam elaborar um planejamento estratégico com metas e objetivos específicos, tanto para a capacitação dos bibliotecários quanto para a implementação das atividades, produtos e serviços com foco na divulgação e disseminação do conhecimento científico.

Para Sala, Lopes, Sanches & Brito (2020), as BUs devem realizar a mediação de práticas eficientes de acesso à informação e, inclusive, implementar iniciativas que objetivem a aquisição de competências em informação tanto para o seu público-alvo, a comunidade universitária, quanto para o público em geral, em virtude da necessidade de estabelecer um diálogo contínuo com a população. Ou seja, é indispensável que as BUs busquem o aprimoramento constante de seus produtos e serviços informacionais, refletindo nas diversas possibilidades capazes de colaborar com o desenvolvimento social, cultural, científico e tecnológico da sociedade. Destarte, apresenta-se, duas bibliotecas que desenvolvem ações de DC, quais sejam: Biblioteca Setorial Árvore do Conhecimento, do Instituto do Cérebro da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (ICe/UFRN) e a Biblioteca Universitária da Universidade do Estado de Santa Catarina (BU/Udesc).

A Biblioteca Setorial Árvore do Conhecimento contribui com os pesquisadores na promoção de eventos científicos e de extensão universitária, objetivando a comunicação e disseminação da produção científica do ICe-UFRN para os acadêmicos e para o público em geral, conforme Costa & Pereira (2020). Entre 2013 e 2019, aconteceram mais de 30 eventos de DC que reuniram mais de 20 mil pessoas, com destaque para o House Symposium, com foco na comunidade acadêmica, e a Semana do Cérebro, destinada à sociedade em geral.

A Biblioteca Universitária da Udesc, em 2019, com o propósito de “[...] permanecer essencial à comunidade, oferecer melhores experiências na utilização de seus serviços e disponibilizar espaços acolhedores [...]” buscou oferecer serviços inovadores, construindo relações com a comunidade acadêmico-científica, e com a sociedade em geral, como explicam Lazzari, Kleinübing, Souza & Trevisol Neto (2022, p. 54). Entre as ações realizadas pela BU para atingir os propósitos supracitados estão: a produção/criação de conteúdo para as mídias sociais; a criação de um calendário de capacitações, direcionadas para os usuários considerando as suas demandas informacionais; a elaboração de vídeos explicativos acerca dos serviços disponibilizados pela BU Udesc; a criação e realização de projetos culturais em parceria com a comunidade acadêmica e com a comunidade em geral; a criação de espaços inovadores de ensino; a inovação nos processos de empréstimo e devolução de livros, com a aquisição de um equipamento de autoatendimento que permite o auto empréstimo e a auto devolução; o serviço de assessoria de publicação científica e a disponibilização de um verificador de similaridade em textos, para a redução da ocorrência de plágio (Lazzari, Kleinübing, Souza & Trevisol Neto, 2022).

Como pode-se observar, algumas iniciativas das BUs que são direcionadas tanto para a comunidade interna quanto para a externa, como a utilização de sites e de redes sociais para a disseminação de informações relevantes; orientações para o acesso aos sítios eletrônicos/plataformas de conteúdo online e a divulgação de fontes de informações científicas confiáveis e de novos serviços criados com o propósito de colaborar com o aperfeiçoamento de conhecimentos, como ressaltam Sala, Lopes, Sanches & Brito (2020). Outrossim, as bibliotecas são capazes de desempenhar iniciativas inovadoras, incorporando novos serviços e produtos informacionais, promovendo palestras, debates e discussões, em linguagem acessível, sobre temáticas científicas relevantes para a sociedade, proporcionando a aproximação e o diálogo, entre cientistas/pesquisadores e a população, sobre o desenvolvimento da ciência e acerca dos benefícios e os impactos da ciência e da tecnologia na sua vida cotidiana. Além disso, conforme Caribé (2013), as bibliotecas são capazes de identificar e divulgar, por exemplo, os principais pesquisadores e as fontes de informação em DC em determinadas áreas do conhecimento, os programas de TV e rádio, filmes, literaturas, peças de teatro, museus de ciências, zoológicos, entre outros.

Em síntese, as ações e os canais de DC devem ultrapassar o ambiente físico das BUs, sendo inovadores e alcançando a sociedade de diferentes maneiras, ampliando o acesso ao conhecimento científico e tecnológico produzido pelas universidades. Destarte, conforme mencionam Costa & Pereira (2020), as possibilidades de contribuição das bibliotecas para a DC extrapolam os serviços ofertados nos seus ambientes físicos, visto que são capazes de colaborar com a disseminação e divulgação do conhecimento científico, promovendo a ampla visibilidade da produção científico-acadêmica dos pesquisadores.

Ademais, na pesquisa de Sala, Lopes, Sanches & Brito (2020, p. 22), acerca do comportamento das BUs do Estado de São Paulo - Universidade de São Paulo (USP), Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (UNESP) e Universidade Estadual de Campinas (UNICamp) - os autores revelam que “entre as redes sociais, o Facebook se destaca como a mais utilizada pelos três sistemas, sendo 70,4% das bibliotecas com perfil nesta rede social, 27,1% no Twitter e 24,1% no Instagram”. Ou seja, a pesquisa indica que as BUs utilizam as redes sociais, principalmente o Facebook, para a mediação e disseminação de informações. Contudo, os autores citam que “as redes sociais ainda são pouco utilizadas pelas bibliotecas e poderiam ser mais utilizadas no compartilhamento de informações com os seus usuários, devido ao seu alcance” (Sala, Lopes, Sanches & Brito, 2020, pp. 26-27).

Nesta perspectiva, as BUs poderiam contribuir, conforme Farias & Lima (2020, p. 17), com a criação e implantação de ações com o objetivo de viabilizar a “apropriação do conhecimento científico-tecnológico pela população em geral, proporcionando empoderamento e participação cidadã para as pessoas que vivem processos de fragilidade/exclusão social”, valorizando a cultura e os saberes locais, buscando, constantemente, o diálogo com os indivíduos. Para tal, verifica-se a necessidade de ações conduzidas por bibliotecários universitários que sejam conscientes do seu papel nesse processo de DC, contribuindo, como explicam Nunes & Carvalho (2016, p. 191), com as “[...] ações de mediação e apropriação da informação”.

Em suma, observa-se que as BUs são ambientes fundamentais para a promoção do amplo acesso e uso da informação científica e tecnológica, por meio das suas ações e iniciativas de divulgação e disseminação, contribuindo, dessa maneira, no combate à desinformação e à descrença na ciência. Todavia, necessitam de investimentos e recursos para a expansão das suas iniciativas, especialmente utilizando as redes sociais como ferramentas estratégicas para a interação com a sociedade, despertando a curiosidade e o interesse pela ciência.

Considerações finais: ações propostas

A partir das reflexões delineadas neste artigo, propõe-se possíveis ações para a DC em BUs. Para serem implantadas, se faz necessário que as autoridades universitárias dediquem atenção especial aos investimentos, para que as BUs possam atender às demandas para o acesso e uso pleno da informação científica e tecnológica, com atenção também para a elaboração de políticas de fomento à capacitação contínua dos bibliotecários para que possam atuar como divulgadores da ciência.

Nesta perspectiva, a partir da experiência das autoras desta comunicação em projetos de pesquisa, estágios, participação em cursos e outras vivências nas BUs, além de imersão na literatura, propomos um conjunto de ações a fim de responder à questão inicial deste artigo: De que forma a biblioteca universitária pode colaborar com a DC para a academia e para a sociedade em geral?

As ações são divididas em categorias consoantes ao referencial teórico apresentado, a fim de proporcionar maior entendimento e alinhamento das proposições: a) ações formativas e reflexivas para o corpo funcional; b) ações relacionadas ao paradigma de disseminação; c) ações relacionadas ao paradigma da participação, por entendermos que a DC encontra nas BUs o espaço com potencial ímpar para alcançar a sociedade sob diferentes perspectivas:

a) Ações formativas e reflexivas para corpo funcional:

  • Apoiar todos que compõem os quadros funcionais das BUs, para que se possa refletir, junto à gestão universitária, se as informações disseminadas, ao serem adequadamente explicadas e apresentadas, por meio de estratégias de divulgação científica, poderão ser compreendidas pelos mais diversos públicos da sociedade em geral, e de que forma isso poderia ser realizado;

  • Tratar as informações sobre ciência e tecnologia não como soluções milagrosas, mas explicar o esforço empreendido para se chegar aos resultados de uma pesquisa, e que é necessário comprometimento das pessoas envolvidas, processos, recursos financeiros, insumos, matérias, métodos etc.;

  • Ter em mente que as BUs têm potencial para ajudar/influenciar na formação de pessoas, a fim de exercerem ativamente sua cidadania;

  • Promover condições para o desenvolvimento da consciência do bibliotecário universitário sobre seu papel transformador diante dos diversos contextos e realidades, principalmente as excludentes;

  • Incentivar a qualificação e atualização constante dos profissionais que atuam nas BUs, visando atender as demandas da divulgação científica;

b) Paradigma da disseminação:

  • Produzir serviços e produtos para a sociedade em geral, a serem divulgados em diversos meios, como os perfis institucionais das redes sociais, que têm sido cada vez mais usadas como fontes de informação;

c) Paradigma da participação pública:

  • Promover eventos de desmistificação sobre temas de interesse da população em geral, como questões ligadas à saúde, mapear e convidar pesquisadores, de preferência da própria universidade, com perfil de divulgador científico, a ser realizado, por exemplo, em um canal de YouTube da biblioteca ou quando for no presencial, chamar a população para ir até as instalações físicas da biblioteca;

  • Procurar estabelecer parcerias com órgãos públicos, entidades diversas, associações de bairros, escolas, grupos de pesquisa que atuem com a extensão etc. visando levar a informação em uma linguagem compreensível até os diversos públicos;

  • Promover debates visando esclarecer dados e pesquisas que a população em geral não compreende, incentivando discussões de temáticas atuais sobre o papel da ciência, o papel da sociedade, e como ambos se relacionam;

  • Criar projetos de extensão que objetivem a DC. Tal como o projeto “Universidade das Crianças” da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG),3 cuja missão é proporcionar a aproximação entre as crianças e a universidade, viabilizando o desenvolvimento de uma cultura científica.

  • Fomentar a criação de feiras (científicas, das profissões), exposições, bases de dados e de fontes de informações confiáveis para estudantes do ensino fundamental, do ensino médio, para a sociedade em geral, além de projetos na biblioteca que possam beneficiar a sociedade.

  • Elaborar planos de estudos de usuários e de comunidades, para conhecer a percepção da população sobre a biblioteca como canal de DC, dos serviços e produtos oferecidos, das razões para as baixas taxas de visitação e possíveis soluções para reverter tais índices, bem como para fazer com que a sociedade se sinta cada vez mais pertencente aos espaços de ciência e tecnologia, e de seus resultados;

  • Propor junto aos cursos de graduação e pós-graduação a criação de parcerias, com o intuito de criar laboratórios e projetos que promovam ações, treinamentos e capacitações formais para a comunicação científica.

Essas ações iniciais que podem começar, por exemplo, por meio de projetos de extensão, em um movimento de ir além dos muros das universidades, e também para abrir as portas desta, para se fazer conhecer pela população em geral de forma real e efetiva. Obviamente, essas ações propostas devem ser adaptadas a cada contexto, a cada realidade.

A urgência em se planejar e realizar ações de DC deve perpassar fronteiras e realidades arraigadas por culturas do não diálogo com a sociedade. Deve romper com a ideia de se promover uma tradução de jargões e da linguagem científica para alcançar públicos diversos, e prosseguir com o paradigma de aproximação real e efetiva com os mais variados grupos sociais, principalmente os que se encontram em situação de fragilidade e necessitam de acesso amplo à informação científica e tecnológica compreensível e adaptada à sua realidade. Nesse contexto, as BUs demonstram ter um expressivo potencial de atuação junto ao seu entorno e à sociedade que lhe cerca, e que talvez ainda não tenha conhecido todo esse potencial, que precisa ser colocado em ação pelos bibliotecários e pelas autoridades universitárias, com constante auxílio de pesquisadores, cientistas e divulgadores científicos.

Financiamento

Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e Fundação Cearense de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico (Funcap).

Referências

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Notas

2 Os dados da pesquisa ‘Percepção Pública da C&T no Brasil - 2019’ estão disponíveis em: https://www.cgee.org.br/web/percepcao
3 Para conhecer o projeto de extensão Universidade das Crianças, acesse o site: http://www.universidadedascriancas.org

Recepción: 04 Octubre 2022

Aprobación: 02 Noviembre 2022

Publicación: 01 Octubre 2023

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